quinta-feira, 24 de julho de 2008

Correio dos Visitantes

O homem, jovem, movimentava-se num desespero agitado entre um grupo de mulheres vestidas de negro que ululavam lamentos. "Perdi tudo!" "O que é que perdeu?" perguntou-lhe um repórter. "Entraram-me em casa, espatifaram tudo. Levaram o plasma, o DVD a aparelhagem...". Esta foi uma das esclarecedoras declarações dos autodesalojados da Quinta da Fonte.
A imagem do absurdo em que a assistência social se tornou em Portugal fica clara quando é complementada com as informações do presidente da Câmara de Loures: uma elevadíssima percentagem da população do bairro recebe rendimento de inserção social e paga "quatro ou cinco euros de renda mensal" pelas habitações camarárias. Dias depois, noutra reportagem outro jovem adulto mostrava a sua casa vandalizada, apontando a sala de onde tinham levado a TV e os DVD. A seguir, transtornadíssimo, ia ao que tinha sido o quarto dos filhos dizendo que "até a TV e a playstation das crianças" lhe tinham roubado.
Neste país, tão cheio de dificuldades para quem tem rendimentos declarados, dinheiro público não pode continuar a ser desviado para sustentar predadores profissionais dos fundos constituídos em boa fé para atender a situações excepcionais de carência. A culpa não é só de quem usufrui desses dinheiros. A principal responsabilidade destes desvios cai sobre os oportunismos políticos que à custa destas bizarras benesses, compraram votos de Norte a Sul. É inexplicável num país de economias domésticas esfrangalhadas por uma Euribor com freio nos dentes que há famílias que pagam "quatro ou cinco Euros de renda" à câmara de Loures e no fim do mês recebem o rendimento social de inserção que, se habilmente requerido por um grupo familiar de cinco ou seis pessoas, atinge quantias muito acima do ordenado mínimo. É inaceitável que estes beneficiários de tudo e mais alguma coisa ainda querem que os seus T2 e T3 a "quatro ou cinco euros mensais" lhes sejam dados em zonas "onde não haja pretos". Não é o sistema em Portugal que marginaliza comunidades. O sistema é que se tem vindo a alhear da realidade e da decência e agora é confrontado por elas em plena rua com manifestações de índole intoleravelmente racista e saraivadas de balas de grande calibre disparadas com impunidade. O país inteiro viu uma dezena de homens armados a fazer fogo na via pública. Não foram detidos embora sejam facilmente identificáveis. Pelo contrário. Do silêncio cúmplice do grupo de marginais sai eloquente uma mensagem de ameaça de contorno criminoso - "ou nos dão uma zona etnicamente limpa ou matamos." A resposta do Estado veio numa patética distribuição de flores a cabecilhas de gangs de traficantes e autodenominados representantes comunitários, entre os sorrisos da resignação embaraçada dos responsáveis autárquicos e do governo civil.
Cá fora, no terreno, o único elemento que ainda nos separa da barbárie e da anarquia mantém na Quinta da Fonte uma guarda de 24 horas por dia com metralhadoras e coletes à prova de bala. Provavelmente, enquanto arriscam a vida neste parque temático de incongruências socio-políticas, os defensores do que nos resta de ordem pensam que ganham menos que um desses agregados familiares de profissionais da extorsão e que o ordenado da PSP deste mês de Julho se vai ressentir outra vez da subida da Euribor.
recebido por mail de anónimo via Panta Rhei

2 comentários:

Anónimo disse...

É um artigo de opinião do jornalista Mário Crespo, da SIC, que esta semana saiu, salvo erro, no Público. E é um dos jornalistas corajosos deste país que vem desmistificar um pouco o que é este escandalo que grande quantidade de calões que exitem por esse país fora que vivem do rendimento mínimo, não dão nada em troca à sociedade e ainda exigem casas do Estado porque não querem viver ao lado dos pretos (como eles dizem). Mas a grande culpa disto não é deles, é do poder político que tem sido incompetente até dizer chega, quer a lidar com as minorias quer na atribuição cega de prestações sociais quem em grande parte serve para sustentar vícios e subsidiar o ócio. Conheço gente que mora ao pé de mim que vivem do rendimento mínimo que se levantam ao meio dia e a primeira coisa que fazem é ir para o café beber a bica e fumar. E quem está a sustentar estes calões somos nós com os nossos impostos.

Anónimo disse...

Muito bem ,haja coragem para dizer o que deve de ser dito, seja o Mário Crespo ou o Zé dos Anzóis foi dito e publicado no " nosso" berlogue, é que isto aplica-se a uns quantos nossos vizinhos ,que estão aqui tão perto de nós.
Mas os vot.....são muito importantes ,ai se são.