segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

Post-It
Equívocos


Papá
Desde há muito que as discussões tinham ultrapassado o razoável entre pai e filho, com a mãe invariavelmente a dirimir a favor do segundo, roçando a agressão física, quando não mesmo se consumava.
-Os teus amigos são uns drenados e bêbedos! Dizia-lhe o pai.
-Não sei quem bebe mais, retorquia com desdém Alex.
-Tem calma, os rapazes agora são assim, gostam de se divertir e de vestir roupas modernas, as coisas mudaram. - Aquiescia a mãe.
Mas as calças de ganga rasgadas, os brincos e os chapéus e pala dia e noite, eram a indumentária de vândalos, a música hip-hop coisa de drogados e bêbedos, e nisto o Sr. Clemente não cedia um centímetro.
Alex era um jovem adolescente sereno, nada dado a confusões, daí a estranheza dos seus amigos quando o viram uma noite, ao fundo da rua, a ser espancado por um desconhecido, uns bons 30 anos mais velho.
A debandada rua abaixo depressa se transformou numa saraivada de socos e pontapés, que se abatiam sobre o desconhecido, enquanto Alex, com as mãos na cabeça gritava:
'Parem ! Parem! Paaaareeeem! É o meu pai!"
- Drogados, bêbedos e vândalos!
- O teu pai tem razão, devias procurar outro tipo de companhias.

Ingénua!?
O desenvolvimento industrial, chutara a família do campo para a cidade, o pai trocara a sementeira e a monda, pelo torno e a rectificadora, a mãe deixou a apanha do tomate pelas limpezas em casa das Srs. Engenheiros e o filho o jogo de bola solitário na eira e as corridas pelas veredas, pelo consumo de droga. Dona Gertrudes ingénua e crédula até doer; passava os dias atarefada no seu trabalho, na lida da casa e no jantar atempado, para que nada estivesse em falta no regresso do seu marido da tasca. Apesar de já ter ouvido falar que a droga dos moços novos era pior que o vinho que corria para o buxo dos pais, nunca lhe ocorrera que o filho não só consumia como traficava. Mas de tanto falatório já não restavam dúvidas. Como toda a mãe depressa assumiu a defesa do filho, descobrindo virtudes inexistentes." O meu filho pode ter muitos defeitos, mas olhe que eu já vi muitos rapazes darem-lhe dinheiro para a droga e ele, para não os prejudicar, fica com o dinheiro, mas não lhes dá a droga", contava com indisfarçável orgulho às vizinhas. Nunca entenderemos onde acaba a ingenuidade e começa o amor de uma mãe destroçada.

Ladrão relapso
Eram o tema da praça central, dizia-se que os constantes assaltos, a toda a sorte de estabelecimentos e casas, tinham de ser coisa de profissionais. O arrojo e a calma demonstrados pela "assinatura" dos larápios eram coisa de gente habituada nenhum ladrãozeco teria a desfaçatez da fazer as suas necessidades após cada assalto no local do roubo. Enquanto a par da sua fama crescia o temor da população e a polícia escassa em meios e elementos era impotente para travar aquele que entraria para a história local como o ladrão do cagalhão.
Uma noite quando a chegada do Verão e dos turistas, substituíra as conversas na praça central e o afamado ladrão não passava de conversa de rodapé, a policia fora alertada para a estranha movimentação num estabelecimento. Armando, meliante com ficha na policia, nunca tinha ido além de pequenos furtos, - mais por ocasião do que por ser ladrão - virava a uma esquina quando um encapuzado em fuga esbarra consigo. Atordoado no chão, ainda assim, consegue distinguir três policias a segurarem Tozé, ladrão de vasto curriculum, a esbracejar, enquanto grita:
- Fomos apanhados!
Dias depois o "Jornal da Vila" rezava na sua primeira página: "Ontem cerca da 23 horas, na Rua Direita, a policia deteve após intensa perseguição o bando de malfeitores que há muito vinha a atormentar a nossa pacata localidade e autores de tão peculiar quanto conhecida assinatura. O Sargento Vinhas, afirmou a este jornal, que dos dois indivíduos detidos, Tozé Sardinha, permanecerá solto com termo de identidade e residência, em virtude de ter confessado e colaborado com a Justiça, nomeadamente, denunciando o seu capanga. Ainda de acordo com a nossa fonte o outro meliante, Armando Justo, não só teimava em não confessar, como revelou-se extremamente agressivo para com as autoridades como com o seu colega de pilhagens, ficará em reclusão a aguardar o julgamento, pois tudo aponta para que seja o cabecilha desta dupla.

“Texto publicado no semanário Noticias de Sines, em 5 de Novembro de 2005.”

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