quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Quase-Ficção


Luís e Júlia, jovens a quem a recente licenciatura, a facilidade de comunicação e boa apresentação permitiu serem seleccionados após apuradas entrevistas, para a empresa de inquéritos e sondagens, auferindo o almejado salário mínimo nacional, acrescido de € 1 por inquérito realizado, fintando o desemprego, a golpes de recibos verdes.
São estas duas personagens que se apresentam na Rua Teófilo Braga, antiga Rua Direita, da cidade de Sines, num final de manhã tristonho, como aliás, tudo o que os rodeia neste dia.
Após três tentativas, todas elas inglória, inclusive na primeira, onde Luís pareceu-lhe ouvir um cão ladrar, algo que de resto, continuaria a ouvir ao longo do dia, eis que se encontram defronte de mais uma habitação de 1.º andar, cuja cor os anos escondeu.
Duas pancadas no vidro da porta, seguido de outras tantas, e nada. Luís e Júlia entreolham-se, viram as costas e avançam para outra porta. Menos um euro, deixa escapar Luís, com um sorriso amarelo, procurando quebrar o gelo.
Eis que se abre uma janela do primeiro andar, donde espreita uma velha, manifestamente à espera que abalassem para ver quem era.

Bom dia! Diz Luísa, expedita ou não fosse ela boa comunicadora, se poder adivinhar o que a esperava. A senhora mora aqui?
O que é que acha, que sou mulher-a-dias, ou outra coisa pior? Dispara a velha.
De acordo com os nossos dados é a D. Josefina!, afirma Luís.
Como? Grita a velha.
É a D. Jo-se-fi-na?
Se sabe porque pergunta?
É dona da moradia?
Que, raio, querem à tua tia? Pergunta Vítor, o marido, tantos anos de acamado como de surdo e o dobro de teimoso.
É do meu Vítor, comprou-a no mar.
Querem levar? levar o quê, mulher? Daqui não levam nada, agita-se Vítor.
O agregado é composto por quantas pessoas, quantas são?
O colchão, puta que os pariu, são do Lar, daqui não saio, berra o homem, olhos irados de sangue, baba e saliva a cuspir, vociferando impropérios.
Mas afinal que querem, desconfia a velha.

Estamos a fazer um inquérito, dizem quase em uníssono, mostrando o cartão da autarquia, para saber o que os moradores gostariam de ver aqui na zona onde moram.
Olhe, - responde secamente a velha rapaz, gostava de me ver com menos 30 anos, sem diabetes, colesterol, tensão alta e a porra deste velho, que há-de porrar comigo, se eu não der cabo dele antes, fechando a janela com estrondo.

Quem era, afinal? O que queriam?
Votos, queriam votos.
Diz-lhes que tá tudo pago.
Hã?!
Os esgotos, tão pagos os esgotos, a merda da velha não ouve nada.

11 comentários:

Anónimo disse...

É verdade Bráz, isto é quase ficção, mas na realidade passa-se com muitos dos habitantes da zona histórica de Sines.
Mas olha, mete o post num envelope e manda-o ao Coelho, pode ser que ele perceba que o que está a fazer em relação á recuperação da zona histórica é mais ou menos isto: ele dá-lhes um parafuso e fica á espera que os velhos construam um automóvel.
Em relação aos teus dois moçoilos, lamento muito, porque afinal estudar uma série de anos seguidos para acabarem a ser borrifados de "gafanhotos" a partir de uma janela de primeiro andar é no minimo deprimente, mas é mais uma vez a realidade que vivemos.

Anónimo disse...

escrita bastante razoável, humor apurado e critica social de nível elevado. Bom trabalho literário. Devia tentar ir mais longe.

Anónimo disse...

esta é a relaidade do centro histórico. abandonado a meia dúzia de idosos, a quem os partido politicos tenta piscar o olho ao memso tempo que dizem promover a cidade piscando o olhos aos que aí não moram. mas a realidade é a droga, alcool, prostibulos, violência à noite e o abandono, lojas fechadas, comercio falido durante o dia. A facada final foi o fecho da rua do cinema em nome de um edificio (centro de artes) feito como obra do regime para imortalizar o Sr. Presidente.

Anónimo disse...

Agora em Fevereiro quando a CMS começar a fazer os inquéritos, hão-de haver muitos casos destes e parecidos no centro histórico. Não é assim que isto vai lá quanto á recuperação desta zona urbana. É com apoios financeiros e incentivos mais substanciais aos moradores, como já se faz noutras zonas do país. Caso contrário pouco muda. Há verdadeiras aberrações arquitectónicas que é urgente corrigir, que agridem aquele contexto, falando de alterações de fachadas, portas, janelas, etc. E não se vêem politicas para corrigir isso, nem sensibilização junto dos habitantes muitos deles com grande ignorância nestes assuntos. Há grande responsabilidade da CMS nisto, sem dúvida nenhuma. Foram deixando andar, pouco ou nada fizeram, e agora aí está um big problema que vai levar anos a resolver. Mas sem dinheiro, sem programas que financiem os moradores, eles não têm capacidade para intervir como é desejável.

Anónimo disse...

Aos anos que se ouve falar em arranjar-se o centro histórico é lamentável que ainda se esteja nos inquéritos quando tudo isto já podia estar muito mais avançado. O centro histórico de Sines por culpa da câmara é um local morto, sem vida, sem esperança a médio prazo, onde à noite parece uma cidade fantasma.

Anónimo disse...

Todos conseguem ver o que se passa no centro histórico menos a cms que teima em só fazer disparates é uma vergonha para Sines.

Anónimo disse...

Até me admira o Braz não trazer aqui mais fotos de exemplos de degradação do nosso centro histórico, que há anos se arrasta entre palavras bonitas de restauro, de intenções cheias de floreados, mas de obras, nada. Vejam que ainda estamos na fase dos inquéritos porta a porta!!!!!!!!!!!!! Já era tempo de um mini polis para Sines!!!

Anónimo disse...

Com tanto postalinho para fotografar, só o braz não chegaria. Tinha que ser uma equipa.

Anónimo disse...

SR.Presidente Coelho é urgente fazer obra que meta o centro histórico num brinco, como deve ser. Isto tá praticamente morto, só quase com velhos, o comércio está em crise profunda, e só uma obra de profundo restauro de toda esta zona pode voltar a fazer renascer toda esta zona. Deixe-se de inqueritos e outras entretengas para alongar o tempo e faça mas é as obras que fazem falta.

Anónimo disse...

Quando passo pela meia-laranja,
recordo-me de quantos gaitos andavam jogando a bola por ali,fazendo cabanas na barroca, era um sitio cheio de vida(crinças),tudo isto me entristece ao ver aquela zona historica degradada e ao abandono, a unica coisa que vinga é bares de alterne, que podridão!!!
Todos falam mas não se faz nada!!

Anónimo disse...

Penso que se fossem feitas as obras certas, que ficava uma zona toda ela muito gira e interessante para sines e para o turismo. Só que as pessoas, a maior parte, não devem ter dinheiro para alindar as fachadas, tirar aluminios e outras porcarias que destoam de uma zona antiga. Eu acho.