sábado, 29 de novembro de 2008

Sines 1936




Filme de 1936, disponível no Museu de Sines, obtido a partir do arquivo da RTP, constituído por três partes: vistas de Sines e da sua praia, chegada do comboio a Sines e inauguração do Lar Prats.

Para efectuar o seu enquadramento, nada como o texto do historiador João Madeira, em Setúbal na Rede, a 15.02.2006.

"Um filme de propaganda

Vai para setenta anos que em Sines se juntou muita gente para esperar a chegada do primeiro comboio. Concluía-se assim o ramal de Sines. Ouvi há alguns anos mulheres ainda contarem como foram da Costa de Santo André, uns bons quilómetros a norte, a pé, pela praia, assistir ao acontecimento.
Há desse dia um filme, um filme de propaganda do Estado Novo, evidentemente, que termina com uma imagem curiosíssima – o administrador do concelho e o governador civil de Setúbal apertam as mãos, cumprimentando-se sorridentes, os olhos na câmara que lhes capta os movimentos e em fundo a baía com uma bandeira nazi, a cruz suástica inscrita, nítida, adejando.
O curioso reside no inusitado da situação, na presença ostensiva da bandeira no filme, situação explicada pela conjuntura política no distrito em que o governador civil, da extrema-direita do regime, representante activo de uma corrente claramente pró-nazi, teceu uma rede de administradores dos concelhos, a quem cabia nomear, da sua total confiança política, cuja acção foi por muito lado, em Sines e Santiago do Cacém concretamente, limpar do regime o velho conservadorismo liberal de extracção republicana, representado principalmente nesses concelhos prelos Presidentes da Câmara, e fascizá-lo no mais estrito sentido do termo.
O filme é aliás, todo ele, um documento extraordinário do que era a iconografia, o simbolismo de uma cerimónia pública encenada e explorada pelo regime até ao mais pequeno pormenor. A entrada da locomotiva na gare engalanada, a descida solene dos dignitários do regime, as ruas enfeitadas com cruzes de Cristo e esferas armilares, a assistência social aos ex-combatentes da 1ª guerra Mundial, o cortejo das escolas…
A sua importância longe de uma qualquer dimensão apologética permite a desmontagem do simbolismo da cerimónia, como permite também ver em movimento como era Sines, o seu porto, a baía, a praia nos anos Trinta.
O filme é neste sentido um objecto insubstituível de património documental e como tal merece a sua preservação no suporte no formato original, mas deve merecer também a sua reprodução para suportes hoje mais comuns e mais democratizados, como o vídeo e o DVD.
Por esses meios poderá ser divulgado entre a população de Sines; levado às escolas e tornado um recurso educativo passível de múltiplas utilizações; contextualizado e mediado pelos depoimentos orais dos protagonistas ainda vivos que assistiriam ao acontecimento; tomado ainda como peça documental de um conjunto substancialmente mais vasto do que pode constituir a memória, necessariamente plural, sobre o que foi e o que significou a chegada do comboio a Sines.
"

2 comentários:

Fundamental e o Acessório disse...

Curioso e com um fim surpreendente no minimo.

A título de curiosidade revia à poucos dia um documentário sobre propaganda politica no sec xx e são incriveis as semelhanças entre os lados da politica nesta matéria.
Alêm de serem a preto e branco, tem todos um objectivo de mostrar o povo do lado das elites politicas, sempre com os militares em 1º plano.
Será que o extremos politicos serão tão diferentes assim?
para mim desde que sejam extremos é mau.

abraço

Pedro Ventura

Anónimo disse...

Há muita coisa neste video que ainda hoje podemos identificar, na praxis politica, quase um século depois, apesar dos protegonistas serem outros, e agora vigorar um sistema Democrático (embora cada vez mais injusto para o mexilhão....diga-se também, como no tempo da velha senhora).