quinta-feira, 9 de setembro de 2010

saudosismos à parte

Em tempo de crise, num país que é dono da palavra saudade, é natural que se veja o passado com um certo saudosismo. A revolta contra a dor presente suaviza dores passadas e como se sabe é sempre mais cómodo dar dois passos atrás do que um à frente, é mais seguro um terreno já pisado do que um que não se conhece ainda.

Gostei muito de ler a carta aqui postada pelo Egídio Fernandes porque me fez recordar histórias que os meus pais me contaram tantas vezes à mesa da cozinha, comigo desconfiado na minha meninice. E ainda hoje, quando eles mas contam, parece que custa a acreditar, mas foi verdade, que já mas contaram tantas vezes, sem que o tempo lhes tenha mudado nada, que as torna demasiado legítimas para que possam ser questionadas. Por isso ao passado não voltemos, que eu não quero ter roupa que só uso ao domingo e uma rolha na boca.

Estamos no ano 2010, numerado à ordem de alguma história que hoje, felizmente muito poucos conhecem bem, porque a mentira tem perna curta, principalmente na sociedade da informação.

Lembro-me que quando estudava, o meu principal medo era o de entrar no sistema e depois ser incapaz de sair dele, nem era tanto o medo de um dia querer sair e não conseguir, mas o sentimento de que isso para mim, um dia, seria de todo impensável, que seria incapaz de ter um pé dentro e outro fora. Hoje, depois de já ter provado um bocadinho desse bicho papão, questiono-me se alguma vez me irei adaptar aos ritmos e sabores da nossa sociedade laboral. Se na escola, em que incluo a faculdade, temos um ensino demasiado generalista e teórico, em que tudo são rosas e o verdadeiro oficio pelo qual andamos ali é relegado para segundo plano em detrimento do conhecimento que em teoria nos será útil, mas que raramente o é, na vida profissional tudo muda e o que aprendemos raramente tem interesse para os que nos chefiam, presos a esquemas e tácticas a que nós, jovens outrora idealistas temos que nos adaptar.

- Ou entras na dança ou ficas de fora!

Falemos à vontade, que tudo nos é permitido dizer, ao menos isso. Ganhámos a liberdade e de um momento para o outro pudemos dizer tudo o que nos indigna e que achamos errado ou injusto, mas depois, ou ninguém nos ouve, que isto diz-se tanta coisa, ou temos de o provar em tribunal, numa justiça que não é justa e que muito menos é igual para todos. Ganham os tubarões, e os outros, a maioria, que também quer jogar, porque quem não joga não ganha nada, fica calada, porque se fala ainda alguém a lixa.

Da monarquia, para a República, com uma ditadura castradora pelo meio, estamos agora nesta Democracia dominada por partidos políticos que engolem tudo o que se lhes atravessa no caminho. Não será assim por muito tempo, porque os segredos são cada vez mais difíceis de manter e as mentiras já ficaram muito atrás dos coxos, que hoje já há próteses para todos os gostos.

O que vem a seguir apenas pode ser especulado, mas para mim, é inevitável uma maior participação do povo e uma coisa é certa, o poder cada vez estará mais acessível a todos, porque só assim podemos chegar a uma sociedade que valoriza o mérito em vez da cunha, o justo e não o xico esperto, a transparência sob o obscurantismo. Por isso aceitemos de uma vez por todas, que o mundo mudou muito nos últimos anos e que vai mudar ainda mais e que o óbvio não pode ser ignorado, porque o mundo gira todo ao mesmo tempo e enquanto é dia num sitio, no outro pode muito bem ser já noite escura.

3 comentários:

Rasta Xungoso disse...

This is, a momentary lapse of reason, onde é que já ouvi isto?.
Ainda o hei-de ver de barba grande e boina preta ornada com estrela vermelha. Não desanime, ainda é novo e quem sabe se virá a ser uma chefia de amanhã.
Um mês depois do FMM já está em depressão profunda, coitado.
A minha parede já está branca e radiante de novo, mas o amigo está deveras taciturno, que tal ir á Câmara e pedir ao amigo Coelho um tachito, os ordenados não são famosos mas não existe por lá quem mande, cada um toca o que sabe, foram todos formados pela Escola de Artes.
Ah, quase me esquecia se lá fôr tire a boina com estrela, que isso agora é sacrilégio por aquelas bandas.
Muita saúde.

Bruno Leal disse...

De boina preta ornada com estrela vermelha acho que nunca me verá, mas sabe? eu sei que sabe... com o passar dos anos vamos vendo as coisas de forma diferente, isso é uma das coisas que mais me fascina nos "velhos".
Ainda bem que a parede já está branca, fico feliz por isso, acredite. E afinal não foi assim tão mau o pós FMM, Sines tem outros encantos que às vezes esquecemos mas que acabamos sempre por redescobrir.
Quanto ao amigo Coelho, não me parece que fosse capaz de lhe ir pedir algo que não achasse que merecesse, e como acho que não mereço aquilo, essa hipótese fica excluída.
Espero que as suas paredes continuem brancas e o seu humor continue negro.
Muita saúde

Anónimo disse...

Bem....aposto que lá vem o autor do "desabafo" que tanto me fez rir ...
O tal da parede incompreensivelmente "borrada" !!!!

Vá lá.... o espaço não é propriamente para as "comadres" comporem os seus desaguisados !!!

A questão é séria e, o Bruno Leal, autor desta "reflexão", tem toda a razão...a coisa tá negra ....

E, atenção.... "cada um toca o que sabe, foram todos formados pela Escola de Artes"... não é verdade. Ainda há muitos, que mesmo "tocando aquilo que sabem", não foram "formados na escola de artes" !!!

Terei que, por um lado, concordar com um, por outro, com o outro....
É que de facto, muitissima coisa não está bem, mas, nem tudo é farinha do mesmo saco ...

Há alguns (funcionários), que continuam a fazer o melhor que sabem e/ou que lhes permitem. Há allguns, que diáriamente se esforçam, para que, tal como é referido no post, possa,m fazer a diferença....acreditando, não sêr necessário se "venderem" ao sistema !!!
Afinal, nada é eterno... e "isto" já esteve mais longe de mudar. Não sei se para melhor, ou pior....mas mudar !!!